Uma dança das florestas
© Estelle Valente
O Morto e A Morta, “dois espíritos dos mortos inquietos” que em vida foram marido e mulher, são trazidos de volta pelo Deus Aroni para a Reunião das Tribos. Num estranho ritual de morte, expiação, desobediência e renascimento, O Morto e A Morta confrontam quatro mortais: Rola, uma prostituta que na vida anterior foi Madame Tartaruga; Adenebi, um historiador da corte do Imperador Mata Kharibu, é agora um orador do conselho; Agboreko, foi um adivinho do Imperador Mata Kharibu e nesta vida mantém a mesma atividade; e Demoke, escultor, que outrora foi poeta da corte. Todos carregam feridas de um outro tempo, o que os precede é também o que determina o seu presente, são o antes e o que se segue, o humano e a floresta. Todos são em simultâneo o que são e o que foram – os mortos e os vivos também. Como uma metáfora botânica devoradora do sentido do mundo, quanto mais se avança na ação mais se recua no tempo.
O mundo são tempos.
Uma dança das florestas é mundo que se cria, em tempo, numa floresta de paus, de olhos devoradores, bocas escancaradas, braços que falam, pernas que voam, céus que são chão.
Atuantes esdrúxulos feitos de tempos –
pré-história,
pré-invasão,
pilhagem,
independência,
liberdade que ainda não chega,
porvir
e ancestralidade –
disputam na cena-mundo os lugares do poder, da morte, da vida e do (re)nascimento.
Atrevem-se a ser divindade, humanidade, maldade e Floresta. Mas sempre são mutações de tempo que rompem fronteiras.
“Cair nas correntes subterrâneas”, navegar “através da crosta endurecida do antiquíssimo vómito” para por fim irromper na clareira de tempo que está cem gerações mais à frente, onde nas boas-vindas aos Mortos o sónico corrompe o verbo, a fala rasga a forma e a imagem se mostra:
Preta. Desmembrada.
“Os pescoços estão todos a ranger de tanto olharem para cima”. Há dor. Os corpos têm então de se esfregar até que os demónios de sangue inchem e explodam. Vermelho.
“Deem aos mortos espaço para dançar.”
Os corpos são espasmos, a floresta toda se amontoa e a Cabeça da Floresta destapa as formigas cujos pêlos se eriçam “como caudas de escorpiões.
Zia Soares
© Estelle Valente
© Estelle Valente
Direção, encenação: Zia Soares
Texto: Wole Soyinka
Tradução: Rita Correia
Dramaturgia, outros textos: Zia Soares
Interpretação: Ana Valentim, Cláudio da Silva, Gio Lourenço, Júlio Mesquita, Matamba Joaquim, Miguel Sermão, Rita Cruz, Vera Cruz
Cenário e figurinos: Neusa Trovoada
Música e design de som: Xullaji
Desenho de luz: Jorge Ribeiro
Assistência à encenação de movimento: Vânia Doutel Vaz
Voz off: Xullaji, Zia Soares
Confeção de figurinos: Aldina Jesus Atelier
Fotografia: Mónica de Miranda, Estelle Valente
Vídeo (teasers): António Castelo
Estagiário (Bolsa Procultura): Noé João
Produção executiva: Aoaní d’Alva
Produção: Teatro GRIOT
Coprodução: São Luiz Teatro Municipal
Apoio: Academia Arte & Dança, Batoto Yetu, Casa da Dança, Junta de Freguesia da Misericórdia, Khapaz, KMT-Associação Moreira Team, Polo Cultural Gaivotas Boavista
Agradecimentos: Carlos Caetano, Elson Moreira, Estufa Fria de Lisboa
O Teatro GRIOT é uma estrutura financiada pelo Governo de Portugal – Ministério da Cultura/Direção-Geral das Artes e pela Câmara Municipal de Lisboa
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